╡CAPÍTULO UM╞ FESTA DE CASAMENTO


                               _____________ Parte I _______________
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ANTES DE TUDO


CAPÍTULO UM

FESTA DE CASAMENTO


ERA UMA VEZ um lugar que tudo tinha uma história. Eu sei que a maioria das coisas normais ou anormais tem uma história, um conto e uma maneira hilária de se contar, por exemplo, de como você conseguiu seu presente de aniversário, ou o porque seu chaveiro tem cavalos desenhados ou porque que você prefere recostar-se sobre uma confortada grama vislumbrando a lua no dia oito ou quinze ou vinte e dois de abril ou de qualquer outro dia ou mês. Mas, neste lugar que as pessoas nem mais ouvem falar, tem uma história para tudo. É claro que eu não vou contar todas elas aqui, iria passar anos de minha vida para contar-lhe cada coisa. No entanto, existe uma história muito especial que as pessoas precisam lembrar... Espero que você tenha um estalo na mente e se recorde de alguma poesia, canção, frase ou uma pequena história ao que eu revele o nome. Pois é meu caro, essa história passa-se em Lubrín.
Caso você não se recorde, ou esse nome ainda não tenha chegado a seus ouvidos, vou descrever aqui, que coisa mágica é esse lugar e como ele tem tudo a ver com a história, mais ainda se chegarmos ao castelo de vinho, sim, de vinho, e para isso também tenho uma história, eu já chego lá.
Lubrín era bem grande, isto é, sua região. Caso subisse no centro da cidade, onde é localizada a torre mais alta da catedral do sino e, se olhasse por cada janelinha de mosaico, onde sua visão chegasse, era Lubrín, simples assim. O que estava atrás das colinas não era mais, porque não se via nada além dela, então, onde sua visão alcançasse a partir desse centro, seria Lubrín. Bem grande não? Eu disse. Porém antes do limite de onde você enxergasse estava a cidade e suas casinhas bem postas, organizadas por bairros. Cada casa com sua história também, principalmente na quarta leste, um casebre que parecia um beco de tão estreito e pequeno. Quando passearmos para lá, eu conto a história dessa casinha. Mas aproveitando que estamos na torre da catedral, se olharmos na janela que mostra o sul, temos a visão maravilhosa do castelo e podemos imaginar o que o herdeiro do trono está fazendo. Se fossem oito horas da manhã, seria melhor não incomodá-lo, pois devia estar comendo as guloseimas do café da manhã e isso queria dizer café, torrada, suco de laranja, suco de mamão, pães com peito de peru assado e gelatina de framboesa ou maracujá, mas como já são quase onze e meia, ele deve estar olhando os impostos tamborilando os dedos na mesa e fazendo anotações. Vamos dar uma olhada.
Para chegarmos nos portões metálicos do castelo, temos que passar da primeira sul até a oitava sul, contado do centro. Ali naqueles bairros viviam pessoas ricas, todas em dia com os impostos – já que estamos falando nele -, com dinheiro de sobra nos bancos e tendo um dia maravilhoso recostados no espaldar fofo de seus sofás feitos à mão, lendo as notícias ou livros antes de voltar ao trabalho, isto é, as que trabalhavam, pois muitos daquela avenida, podemos chamá-la assim, herdaram coisas de seus avós que ou tinham rebanhos ou participaram de alguma aventura no passado, ou trabalharam sete dias por semana dezoito horas por dia, então, eles lá, ficaram com a região sul, com uma vista bem agradável do quintal do castelo que descrevo assim que passarmos do portão, se os arautos e o porteiro nos deixarem passar.
Próximo ao castelo, cerca de quatro casas de distância, casas realmente grandes, estava a estalagem Pote De Ouro, que não tinha a melhor comida, mas era a mais divertida da cidade, embora fosse a mais rica e de quartos mais luxuosos, por conta do jogo de bilhar que sempre os ricos iam apostar suas moedas de ouro e a casa ganhava trinta por cento, e eram apostas altas. Os quartos ficavam no segundo, terceiro, quarto e quinto andares, cada uma com seu banheiro, lençóis impecáveis, armários embutidos, todos os quartos de madeira maciça, polida de ofuscar os olhos e cintilar estrelas quando a cortina fosse aberta no meio da noite.
Mas não vamos nos apegar a ela por enquanto, pois sua história está reservada para bem mais adiante e talvez eu tenha que relembrá-lo da estalagem quando for hora de voltar nela. Vamos voltar a caminhar em direção ao castelo.
Depois que as casas acabavam, dava-se mais duzentos metros para a rua que dava acesso ao portão dianteiro, e esta já era bem mais sofisticada, ladeada por calçadas - ornamentadas com pedras não preciosas, mas cintilantes - protegidas em suas margens por muros altos de rocha azulada. No final da rua chegamos ao portão metálico, duplo, com grades de ferro no seu superior, com hastes protegidas com lâminas pontiagudas. Dos lados esquerdo e direito do portão no interior dos muros, havia em cada lado uma torre de segurança com arqueiros no topo, para proteger alguma de invasão ou visita indesejada. Espero que não levemos nenhuma flechada agora.
Primeiro, bate-se no portão com suas aldravas de sino (e para isso também há uma história que vale a pena ser contada aqui, mas esperemos pelo menos meia hora) que logo mais são trocadas por aldravas de uva, para combinar com a decoração; e esperar sermos atendidos. O porteiro abre a portinhola para ver quem nós somos e nos deixa entrar sem problemas, afinal sou em quem está contando essa história.
No que o portão abre, céus, que visão bonita. Nos deparamos com várias trilhas com placas indicando os caminhos, mas como vamos ao salão real, vamos escolher a do meio e caminhar até o interior do castelo. Enquanto não chegamos, eu vou descrever o jardim como prometi agora pouco que o faria.
Do lado esquerdo de quem entra pelo portão dianteiro, se é levado até uns quiosques, com bancos e bem sombreados para aqueles que quisessem descansar, mas sem exatamente dormir, e só vislumbrar deles os lagos muito transparentes de dar até sede e vontade de nadar, decorados com flores de diversas cores em seu contorno, entre margaridas, rosas azuis, vermelhas e brancas, grandes e pequenas. Também um gramado plano enorme, com várias árvores de copa larga, algumas macieiras também, onde haviam cavalgadas ao ar livre ou jogos com bolas e onde eram feitas as festas de aniversário quando havia uma. No contorno do castelo, naquele andar, havia uma varanda cujo o chão era revestido por ladrilhos brancos e onde o andar superior era sustentado por pilares cilíndricos.
Do lado direito havia um zoológico, os animais eram bem felizes e bem tratados, alimentados e cuidados, mas é claro que não havia todas as espécies, havia papagaios, macacos, ursos, tigres, coelhos e um hipopótamo muito preguiçoso, havia também dentro do zoológico um playground com gangorras, balanços, escorregadores e uma piscina pequena.
Mas agora que estamos de fronte a porta para adentrarmos no castelo, vamos girar a maçaneta dourada e mergulhar pelo corredor. Este era semi-iluminado por tochas e lustres de candelabros que desciam por correntes do teto, bem ao alto. Dos lados haviam armaduras de placa completas vestindo estátuas de pessoas importantes de outrora – cujas histórias não entram aqui -, para também homenagear tais pessoas, haviam vários quadros delas, e paisagens antigas de mais de quinhentos anos do mesmo castelo, enfim, agora viramos à esquerda e pegamos uma escadaria que nos leva ao andar superior.
A narrativa por enquanto não tem protagonista, não sou um deles, se é que você quer saber, mas sou eu o responsável por contar a história, mas vamos ao primeiro personagem que finalmente aparece nessa história e acho que posso despedir-me de você, embora eu esteja aqui o tempo todo, fazendo você pensar e imaginar nas muitas palavras que ainda tenho a dizer, pegue uma bebida, vá com o livro de frente ao fogo se estiver frio ou nalguma sombra embaixo de uma árvore ou deite em sua cama sob as cobertas ou por cima delas, mas preste bastante atenção.

2

COMO IMAGINAMOS O herdeiro do trono estava mesmo verificando os impostos de Lubrín, mas ao invés de tamborilar os dedos, ele estava com o cotovelo apoiado na mesa de madeira escura, a mão na bochecha e os olhos distantes além da janela lembrando-se de como fazer tudo certo. Ele se vestia de maneira elegante, um manto marrom felpudo aberto na frente, com um botão de chifre solto na altura do pescoço, ia-lhe de ombros aos pés, não era algo muito quente, mas muito confortável. Embaixo do manto, usava uma camiseta vermelha. Vestia também uma calça preta presa com um cinto de couro cuja fivela era de prata. Depositada em sua mesa, sua coroa de aço com lascas de jazidas com poucos ornamentos, na verdade minimamente, com apenas uma obsidiana na altura da testa, cintilava negra o raio do sol que se projetava pela janela invadindo a sala iluminando a mesa. Ao lado da coroa estava uma xícara de café que já estava muito frio para beber, pois ficou lá muito tempo, desde que se sentou para ler os documentos.
O herdeiro nunca esqueceu-se de nada que seu pai O Rei da Lubrín de Sinos, lhe dissera. Gustavo como você pode chamar, o príncipe, o herdeiro, escutava seu pai com tanta atenção e admiração que seria capaz de declamar com cada vírgula exatamente tudo que seu pai lhe ditara e ensinara à claridade do lustre em forma de sino. Mas depois que seu pai morrera num combate, à flechadas, contra quatro saqueadores, Sid, o conselheiro e também juiz da corte, passou a ensinar-lhe.
Sid era um homem velho, sempre por trás de uma touca, aqueles olhos negros, que nunca envelheceram – ainda conservavam naquelas órbitas um olhar de criança que Gustavo contemplava ao escutar suas histórias nos dias de chuva. Gustavo era em seus dezesseis anos ensinado assim a ser rei e, é claro, haviam aquelas aulas que qualquer criança tinha nas escolas, mas as dele, antes da morte d’O Rei, eram particulares. Um tanto chatas. Ele comemorava quando era dia de chuva, pois nesses dias as aulas eram interrompidas e Sid lia-lhe histórias maravilhosas, mas as preferidas eram as que vinham da cabeça do conselheiro, inventadas. Hoje em dia, ainda, quando uma tempestade cai enfurecida do lado de fora, Gustavo pede-lhe histórias diante da lareira e não perde a sensibilidade de quando pequeno, ainda se assustando surpreso nas cenas intrigantes, perdendo noção completa de que há um salão à sua volta e o crepitar do fogo, entrando num mundo desconhecido esquecendo-se até mesmo de que é herdeiro!
Depois da morte d’O Rei, as responsabilidades caíram em sua maioria nas mãos de Gustavo, então Sid passou de seu tutor para conselheiro-mor, como já se era esperado e muitos anos depois dessa história ele manteve-se nesse patamar. Numa daquelas histórias que não se conta aqui e que provavelmente nem será eu que irei contar, Sid recusara o trono do reinado que lhe era oferecido, pois dizia que seu lugar era ao lado de mãos dadas com o rei e não encostado no espaldar de forro fofo do trono. Sid, como você já podem perceber, tinha coração nobre e leal.
Como O Rei morrera no começo da juventude de Gustavo, ainda em sua imaturidade, a princípio era Sid quem governava, mas a todo o momento o herdeiro, aprendia tudo o que Sid lhe ensinara, como na ocasião que Gustavo encontra-se agora, inclinado com o cotovelo na mesa, lembrando-se de como cobrar os impostos. Foi mais ou menos assim que o conselheiro-mor lhe ensinara:
Com um mapa nas mãos, Gustavo via Lubrín. No mapa as casas eram vistas de cima e as regiões circuladas; no teto desenhado de cada casa havia em número o valor do imposto e a data da cobrança.
- E aqui, por que essas interrogações? – perguntou Gustavo apontando para um lugar pintado em vermelho.
- A quarta leste, vossa majestade, é o lugar em que temos que ser compreensíveis. É a região mais pobre de nosso reino, nunca podemos cobrar muito ali, pois podem-lhe faltar o pão na manhã seguinte, devemos sempre pedir o que eles tem a nos oferecer.
- Hm, certo. Mas e quando nada têm eles a nos oferecer, o que fazemos? – indagou Gustavo com o dedo no queixo, interessadíssimo.
- Se não nos podem oferecer dinheiro, vossa majestade, pedimos a eles qualquer serviço ou ensinamento – disse Sid virando os olhos do mapa na mão de Gustavo, para os olhos dele, erguendo as sobrancelhas. - As pessoas têm sempre algo para nos oferecer. Quando nos damos com pobres e ignorantes, doamos um livro para enfim, podermos cobrar-lhes ao menos uma história na próxima visita enquanto tomamos café da tarde ou da manhã. Mas em Lubrín nos tempos de hoje, todo camponês tem algo a nos oferecer – respondeu-lhe fitando nos olhos o rei, que como sempre lhe dera muita atenção. Depois voltou-se para o mapa explicando-lhe o resto.
Lembrando-se de tudo, Gustavo piscou e se endireitou na cadeira, pegando uma pena, molhando em tinta preta e começou a escrever os relatórios, conferindo cada detalhe com sua assinatura fina.
A data de cobrança era importantíssima, mas tornou-se ainda mais (e um tanto mais interessante), quando os moradores daquele casebre que citei, na quarta leste, na casinha que parecia um beco de tão estreita, não puderam pagar o imposto depois que Gustavo enviara o relatório recém feito ao cobrador. Mas como o conselheiro-mor explicara-lhe ceifado por sua touca, os moradores de Lubrín têm sempre algo a oferecer e, dessa vez, o que foi oferecido, foi um copo errado de vinho ao Dário, o cocheiro-cobrador.
Mas antes de falar sobre isso, já é meio-dia e os sinos da catedral tocam alto, se espalhando por toda a região onde se vê e eu tenho algo a contar-lhe sobre esse ressoar fabuloso do badalar do sino, é uma história, se não a mais importante, uma das mais; e explica por que as aldravas no momento em que entramos eram de sinos ou por que, se você notou, O Rei era chamado O Rei da Lubrín de Sinos, e por que este objeto esteve presente por aqui em grande parte.

3

AS PESSOAS DE Lubrín amavam o meio-dia assim como nós amamos a sexta-feira depois de um longo dia de estudo e trabalho, porque era hora de descanso de todos e também por causa de um antigo truque deixado pelo Rei da Lubrín de Sinos, aquela antiga cidade – porém a mesma - que lhe disse agora a pouco.
 Assim que se ressoa o badalar, o som alcança cada casa da cidade, começando da torre do sino, o ponto mais alto, o mais antigo, quem sabe, na catedral, expandindo até os muros que corriam o perímetro da cidade; aquele que estivesse do lado de fora, não ouviria jamais. E O Rei, que era muito esperto, ele mesmo inventara uma magia com a ajuda de seu bobo da corte - Bobo era seu nome -, para que assim que reboasse o som do sino, uma alegria era despertada naqueles que o ouvissem. Não é preciso ser um gênio para saber o porquê que uma alegria era despertada nas pessoas, pelo menos não quando a magia existia, mas,

Para todo aquele que o som do sino tocasse seu ouvido,
Uma alegria viria comigo, uma memória de um amigo
Altas risadas com o cachimbo no alto da colina,
Menos uma hora do dia, uma a mais de cantoria

Foi essa a estrofe, que o Bobo e O Rei usaram para a mágica no sino e a partir desse dia, todos sorriam no momento que o sino tocasse.
Como você está comigo na cidade vou deixar você escutar. Só não peço para que feche os olhos agora, para que possa continuar lendo, mas procure escutar, pois esse som é importantíssimo, tão importante que ele existe até hoje. Escute-o de maneira harmoniosa, faça vibrar em sua cabeça inteligente, guarde-o em sua memória.

Baaaaammmmm

Isso! Prolongue-o. Você consegue escutar de verdade em sua cabeça os sinos que badalam meio dia em Lubrín? Se sim, pois bem, posso continuar a história.
Desde que o sino começou a trazer alegria para as pessoas a cada hora, a cidade passou a prosperar muito, pois o cansaço logo era substituído por uma inspiração. Era a maneira de O Rei dizer “muito obrigado” àqueles todos que moravam em Lubrín. Então, tudo passou a crescer demasiadamente, desde o trigo dos fazendeiros que moravam no centro-oeste, até a floricultura que ficava no norte. E as mulheres passaram a receber mais flores também, mas é claro que como surpresa; as crianças aprendiam mais com brincadeiras, deu-se o fim na choradeira de madrugada e ninguém de Lubrín tinha um mal dia. Bom, com algumas exceções que vieram depois, algumas pessoas que não ficaram tão contentes assim, algumas pessoas que entram um tempo depois nessa história - pois como eu já disse e volto a dizer e não pela última vez: para tudo nesse lugar, há uma história – e para essa, há um espaço mais adiante.
Essa foi a melhor maneira de O Rei governar, e deixar sua memória. E Lubrín teve seu nome de Lubrín de Sinos e tudo era sino pela cidade. Aldravas tinham o formato de sino, na mesa de jantar, pendurado na parede havia um sino, o abajur era em formato de sino, o sorveteiro substituiu a buzina por sino e comerciantes vendiam sinos com vários efeitos mágicos, que não eram de verdade, é claro, mas as pessoas tinham em suas casas mesmo assim.
Assim que O Rei morreu pelos arqueiros quando fazia uma de suas aventuras para o norte, Sid resolveu deixar as coisas como estavam em memória dele e como uma demonstração de respeito, até que o herdeiro tivesse sabedoria o suficiente para mudar isso, se precisasse.
Agora que é meio-dia na atual Lubrín e já viemos muito no passado e não podemos perder o último badalar, pois junto a Gustavo, há mais coisas que acontecem que não posso perder a hora de contar. Já é o momento de voltar para o presente, eu diria. E se bem me lembro, deixei assuntos pendentes com você, algo a respeito do imposto e de um copo errado – calma... Isso já vai fazer algum sentido.
Com o último toque do meio-dia, após escrever a última linha nos documentos, Gustavo olhou de seu quarto para seu povo pelo retângulo iluminado de sua janela e, muito ciente do badalar, ele teve a lembrança de seu pai e sorrira, inspirando-se reinar bem. Levantou-se da mesa e sentiu alguma coisa perpassar seu corpo, como que se houvesse algo ou alguém, talvez as duas coisas lhe esperando. Era jovem, porém ao seu lado no trono não havia ninguém. O herdeiro ainda não era rei, tampouco havia se apaixonado. Não pelo menos até o dia da cobrança de impostos na quarta-leste, que o que vou contar daqui a pouco.
Mas, você sabe: é meio-dia, hora de descanso aqui em Lubrín. Comer, dar risadas, beber uma cerveja antes de voltar para o trabalho, espreguiçar-se, bocejar uma ou três vezes, abraçar a namorada, tomar um sorvete. Então, logo mais eu volto para contar todo o resto que você precisa saber.

4

PRONTO. TUDO FEITO. Estou feliz depois desse breve descanso, pronto para continuar contando.
Cá entre nós o vinho embora varie o gosto de cada um, é a bebida mais tomada. Ninguém recusa um bom vinho servido à taça de cristal numa festa de gala dos Barões e Baronesas no noroeste; ninguém recusa um vinho no aniversário do taverneiro; ninguém recusa um vinho nas tardes de neve ao pé da lareira; ninguém recusa um vinho por mais que esteja atrás das grades; o músico em seu intervalo no concerto da orquestra não recusa um bom vinho.
O vinho por si só é a bebida mais agradável e conveniente. E a família Daco entendia isso muito bem. A menor casa da rua estreita na quarta leste era conhecida pelo quiosquezinho cujo, em época de safra, pendia, graças aos deuses, cachos e cachos de uva. E logo, a família Daco sem saber o que fazer com tanta uva, começara a produzir seu próprio vinho. A adega de madeira dentro do casebre comportava apenas dois barris de vinho, o que já era mais que o suficiente, pois, mesmo que fosse grande a quantidade de uva, era suplantado apenas um barril e a sobra ia para os copos, e a própria família bebia. Aquele único barril era a maneira da família sobreviver, para comprar comida, roupas para a caçula que crescia sem parar, e finalmente o pagamento de impostos. Tudo era feito com o dinheiro que o taverneiro da quarta-leste com seu boteco lhes pagava.  Era um bom vinho.
Era um bom vinho, mas não era sempre que trazia bons lucros e foi exatamente isso que fez com que Ventura Daco, filha do senhor e senhora Daco, se tornasse rainha, olhe só. Espantoso, não? Eu devia ser mais cauteloso para falar sobre isso, mas não, melhor você saber desde já o que lhe espera mais a frente, pois as verdadeiras surpresas ainda estão por vir.
Duas semanas depois que Gustavo escrevera os documentos da cobrança de impostos e entregara a Dário, o cocheiro cobrador, chegou o dia de cobrá-los na quarta-leste.
Balançando em sua carroça, Dário caminhava pela área leste guiando seus cavalos cujos emblemas – bordados de sinos – caiam por sobre as costas. Todos da cidade conheciam Dário, é claro. Alguns o odiavam e achavam seu trabalho desnecessário, mas ele não ligava, vivia cantarolando baixinho sem dar ouvidos aos cochichos e aos xingamentos que lhe faziam quando passava. Era um bom homem e fazia o trabalho para sobreviver. Não fosse esperto, não saberia que tudo aquilo que os outros moradores diziam era apenas inveja de seu trabalho, mas que se os outros exercessem-no não teriam a paciência e humildade que havia em Dário.
Depois de passar pela terceira leste, Dário pegou o pergaminho respectivo do casebre cinqüenta e um ao seu lado, junto a um monte enorme de pergaminhos e desceu da carroça. Passar ali era quase impossível à carroça. Mas não pense que é porque estamos falando de uma região pobrezinha da cidade que ela terá um aspecto sujo. Não, isso jamais. Como Sid vivia dizendo para Gustavo, todos tem algo a oferecer, e o que um Lubríno não admitia é que houvesse lixo em sua calçada ou rua. Portanto era tudo limpo, impecável, sujeira era para os porcos e olhe que até os porcos dos lubrinos eram bem limpinhos.
Caminhando pela rua estreita, Dário cumprimentou puxando a aba de sua boina, um velho barrigudo, careca que lhe erguera o braço. A casa cinqüenta e um dava para a calçada somente uma porta de um metro e meio por dois. Dário bateu na porta três vezes e esperou. Do lado de dentro voltou um “já vai” de alguma mulher e um instante depois, uma menininha abrira a porta, olhando exageradamente para cima esticando o pescoço todo.
- Olá, mocinha. Sua mãe está? Posso entrar? Está tudo bem com você? – A voz de Dário era agradável como a do Papai Noel, consegue imaginar? Bem, é a voz de um velho simpático, eu diria.
A garotinha voltou correndo pelo corredorzinho gritando por sua mãe. Logo em seguida, com uma colher molhada na mão, sua mãe fora para o lado de fora recebê-lo. Seu rosto, percebeu Dário, era de lamento e um tanto preocupado.
-Com licença – disse Dário entrando crispando a boca. Percorreu o corredor e entrou na porta a esquerda já sentindo o cheiro de vinho, uma fermentação bem forte.
- Boa tarde, família Daco da quarta-leste número cinqüenta e um. Vim-lhes prestigiosamente cobrar-lhes o imposto no valor de trinta e cinco peças de cobre, que será usado para o benefício de todos sem exceção pelo herdeiro sob o trono.
A mãe Daco olhou para seu marido, que estava atrás ainda sem se pronunciar.
-Boa tarde, Sr. Dário, cocheiro cobrador – disse o pai Daco dando um passo a frente. – Sinto que não temos dinheiro – falou ele abrindo os braços, explicando. - Mas prometemos que pagamos no mês que vem...  Ou então, podemos... - disse ele olhando para a garotinha e depois para Ventura, sua filha mais velha que aparecera toda suja de vinho, o avental e os pés manchados e com um copo na mão, pela por uma porta que estava aberta atrás deles. – Podemos pagar com vinho! – completou indo em direção a ela, pegando o copo.
-Papai... – Ventura tentou dizer.
Ele a fitou com censura franzindo as sobrancelhas.
-... O vinho ainda não está pronto – ela murmurara baixinho para si mesma.
O copo já estava na mão do cobrador de impostos, que, com o cenho franzido bebia o vinho – que não estava pronto ainda – tornando o copo em grandes coles, depois degustando no paladar o gosto do vinho, procurando ter certeza, iluminando seu rosto.
- Isso, isso é fantástico – dissera ele. – Tenho que mostrar pra o herdeiro!
O pai ria por dentro. O vinho era fantástico.
- Está bem. O vinho será objeto de cobrança dessa vez. Mas nossa! Que vinho magnífico! – dissera Dário. – Mas, bem... tenho que ir-me, avisar o herdeiro desse fato. Me acompanha até o lado de fora?
- Claro! – dissera o pai Daco, acompanhando Dário até o lado de fora. – Não sabe como fico imensamente agradecido. – A família seguia os dois.
Eles chegaram até onde estava a carroça.
- A dívida ainda não está paga, família Daco – disse Dário, subindo, ajeitando as rédeas do cavalo. – Levem o vinho ao castelo – falou distanciando-se -, o herdeiro os espera.
Se você prestou atenção nisso tudo, não precisa – mais uma vez – ser um gênio para descobrir, de como o príncipe, apaixonara-se por Ventura e mudara por completo o destino de todos. Mas de qualquer forma deixa-me explicar. Foi assim:
Na manhã seguinte, a família Daco, vestidos com suas melhores roupas. As mulheres de vestido orlado com renda, porém amarelecidas pelo tempo, e o pai com uma cartola que ficara empoeirada no topo da estante, para as crianças não mexerem.
- Pertencia ao seu avô, Ventura – disse ele limpando-a cheio de orgulho antes de sair de casa.
Eles estavam diante do herdeiro. Havia na mão do pai Daco, uma cuia rústica de madeira, os quatro faziam reverência no pé da escada para subir ao trono. A luz do palácio refletindo o líquido dentro da cuia.
A princípio, seus olhos paralisaram em Ventura. Gustavo mantinha-se sentado observando a reverência, ao seu lado Dário de mãos para trás sem boina, revelando seus cabelos até a altura do pescoço.
- Majestade... – tentou falar o cobrador, mas o príncipe erguera a mão e ele calou-se.
Os Daco ergueram-se e o pai tomou a frente.
- Alteza... – hesitou um instante tentando recordar-se como ser cordial, puxando de olhos fechados os livros lidos. “Pobres sim, ignorantes nunca!” O príncipe ergueu as sobrancelhas.
O pai abriu os olhos e prosseguiu.
- Viemos de nossa humilde casa na quarta-leste mostrar-te o vinho e pagar nossas dívidas, com ele se possível. Não é muito, sabemos, mas é o que temos.
- Traga-me, camponês da quarta-leste, tua bebida e irei julgá-la. 
Enquanto seu pai subia a escada, Ventura puxou o saiote de sua mãe e lhe murmurara:
- Este é o vinho certo, mamãe. Veja, o qual eu fiz ontem... – disse mostrando uma taça.
- Fique quieta, deixe seu pai mostrar o vinho ao príncipe - resmungara rispidamente, quase inaudível.
- É muito bom – disse o príncipe lá do trono – um vinho normal, muito bom. Com quantos pretende pagar?
O pai fechara o rosto tristemente.
- Não temos tanto...
- Eu tenho outro vinho aqui, príncipe – interrompeu histericamente Ventura, correndo até o trono, seu pai a olhava com espanto e o príncipe aborrecido com os maus modos. Porém, ao que chegou ao lado de Gustavo, este foi saciado pelo odor que havia tomado a lisa pele de Ventura, do vinho, de tanto que ela o fazia, era simplesmente o cheiro mais delicioso de vinho que se lembrava já ter sentido, o perfume que mais tarde preenchia cada casa de Lubrín, quando tornou-se rainha. O príncipe sem sequer provar o vinho, apenas sentindo o cheiro perdoara a dívida.
Uma taça de bronze estava quase no nariz de Gustavo e ele recompôs e bebericou do vinho. O semblante do príncipe ou não, camponês ou não, humano ou não, iluminou-se de imediato trazendo junto a sensação de paixão pela filha dos Daco, com lindas lembranças passadas até agora, ele tornou a taça.
- Não só perdôo-lhes a dívida, como peço a mão de vossa filha, ao senhor, pai Daco.
Do rosto triste do pai, nascera uma jovialidade incomparável, ele virou-se para a mãe e ela também sorria, a irmãzinha chupava o indicador, sem entender direito o que acontecia.
- Nunca bebi em minha vida melhor vinho – disse levantando-se  virou para Ventura, seu manto felpudo de cores ornadas e guizos chacoalharam e ele buscou a mão dela.
Foi assim que tudo modificou-se para os Daco e Ventura que, com seu próprio vinho, tornara-se rainha. E a família ganhou uma casa grande na cidade, mudando a vida de todos, na verdade, afinal de contas, porque por magia, o vinho tornou-se símbolo do castelo como lhes disse lá no começo, o castelo de vinho, lembra-se? Mas ainda há mais para contar. A história não acaba aqui. Não ouso mencionar o “felizes para sempre”, porque ainda há muita história para se contar e tudo aconteceu muito rápido. Mas arrume-se para uma festa de casamento, é o que conto a seguir. Com o herdeiro apaixonando-se e casando-se, ele se torna rei ao lado de Ventura, a nova rainha. Porém não é desta Rainha de Lubrín que quero contar, temos que esperar ainda alguns anos se passarem para que você entenda tudo o que aconteceu nesse lugar onde tudo tem uma história.

5

NÃO FOI DE imediato que Gustavo casara-se com Ventura, como você pode ter imaginado. Os preparativos duraram quase oito meses. Gustavo escrevia convites para muitas pessoas de dentro e fora de Lubrín, e também organizava a segurança da hora da cerimônia. Sid, por outro lado o aconselhava, mas não interrompia em nada. Estava muito feliz pelo herdeiro. Finalmente achara sua rainha e iria tornar-se rei! E Lubrín iria voltar aos eixos para seu alívio. Ele não dissera nada a Gustavo para não preocupar-lhe nem pressioná-lo a achar uma rainha, mas havia diversos problemas diplomáticos por conta da herança do trono. No entanto, tudo foi solucionado, bem em cima da hora.
As bordadeiras da primeira-sudeste tinham pilhas de tecido até a testa para orlar. As costureiras da segunda-sul faziam o vestido de Ventura. Havia mais de dez costureiras trabalhando nele. Os ferreiros do castelo faziam sua coroa, que provavelmente era o elemento mais importante do casamento, pois não há rainha sem sua coroa. Não em Lubrín pelo menos.
Um ponto crucial numa cerimônia de casamento, não importa se é real ou não, plebeu ou não, são os sapatos do marido. Estes devem ter um couro fabuloso, e não pode ter muito brilho. Deve ser fosco e limpo, sem marcas de dobras na região dos dedos. Barulho, então, nem se fala. Isso seria deselegante. Os sapatos têm que ser firmes e sem “nheck” ao caminhar com eles. O marido deve andar alvo como um leão. Tropeçar significa azar no casamento e filhos que trarão problemas para a família. Então, vocês podem imaginar como deve ter sido trabalhoso fazer os sapatos de Gustavo, sendo ele o herdeiro de Lubrín.
Os boticários tentaram fazer perfumes para Ventura, no entanto, Gustavo dispensou o trabalho, pois o cheiro de vinho era apaixonante. Era feminino e delicado, levemente doce, parecia que era um odor próprio da futura rainha.
Antes que o tempo passe, para que não cheguemos atrasados no casamento eu tenho que lhes dizer uma coisa para que você não se espante ao ver o casamento. Provavelmente nada é como você ousa imaginar. É claro que vou deixar a surpresa para a hora certa, mas tem um detalhe que preciso explicar.
Antes do casamento é proibido o futuro rei beijar a rainha, se é que eles querem um casamento. O beijo sela tudo. Se o príncipe beijar alguém em público, significa que ele já tem sua pretendente e isso é imutável. Abandonar a moça depois de beijá-la, traria sérios problemas futuros para o reinado. Provavelmente o conselho destronaria ambos, seria um caos para tudo. Está na legislação do conselho dos tronos e só um conselho com todos os outros reinos é que mudaria esse fato. Em Lubrín funciona assim. Bom, é isso que você precisa saber, além dos sapatos e além da coroa.
Havia uma conversadeira extrema dentro da catedral do sino no centro da cidade, que por sinal estava muito bem decorado: Sobre as janelas de mosaicos havia cortinas que desciam do alto teto até o chão, compridas e vermelhas, com sinos dourados em seu meio. Diversos lustres em forma de sino iluminavam todo o ambiente. Nas paredes, tochas com chamas verdes, vermelhas, azuis e amarelas faziam o ambiente ficar completamente agradável e esquentava o frio do inverno que estava por vir.  Todos os convidados postos em seus lugares, sentados nas galerias ao alto, em seus bancos, em suas poltronas próximas ao altar para os mais íntimos, isto é, Sid, e a família de Ventura. Todos conversavam, era muito comum altas risadas antes do casamento e muitas fofocas. Alguns convidados ficaram surpresos da futura rainha ser da quarta-leste.
- Daco? Não sei o que Gustavo viu nela – diziam alguns. – Ela não tem nada de especial e nem faz parte de nenhum baronato ou condado. Ela morava na quarta-leste, pelo que sei.
- Ouvi falar que eles embriagaram o príncipe. Eles não fazem vinho?
- Não seja tola, mulher. O rei jamais cairia numa coisa dessas!
- Ela não é linda? Eu quero um perfume igual ao dela- falavam as mocinhas.
Diferente do que você está acostumado, a esposa não chega de carroça e entra pelo meio, onde todos abririam alas, e vai até o altar. Em Lubrín acontece de outro modo.
Os sinos das dez da noite badalaram e todos se calaram e ficaram de pé, pois era a hora marcada de tudo começar. Um silêncio apaziguador, repentino, cortado por algumas tosses tomou conta de Lubrín. Todos os lustres apagaram e uma penumbra tomou conta do lugar, as tochas bruxuleavam ainda nas paredes altas chamas coloridas. Ventura entrou pelo lado esquerdo no altar diante de todos, caminhando solenemente, delicada como uma brisa. A saia de seu vestido era longa e azul claro, ornando com seu vestido de detalhes prateados e outros tons de azul mais escuro. O corpo era delineado perfeitamente por ele, marcando seu corpo jovem e perfeito à sua maneira. Ao invés de música como você pode estar sentindo falta, era o silêncio puro. Porém ao que ela pisou no primeiro degrau da escada, uma poesia, ou ao menos assim parecia, num idioma ininteligível, ecoou pelas paredes da catedral, sem origem, era algo mágico e agradável como a água que faz queda lentamente por dentre rochas num córrego sem forma passando agradavelmente no coração das pessoas que viam-na indo até o centro.

Perla passa vista, Ventura, mis nasvilla
Lubrín dorno vello, duanti dorpo
Perla passa vista, quarti nella
Gustavo, porti di porti, misso torpo
Persá missa duanti, Lubrín parti passa
Polormo quarti missosvilenos
Gustavo di Ventura
Derivella cariremos

E assim, enquanto a poesia corria, com a mão direita Ventura passava tilintando badalos de sinos, num tom agudo reverberante como lágrimas que caem do céu, brilhantes, tocando o solo.
Do lado direito, Gustavo caminhava furtivamente, tão alvo com um leão, como deveria ser, eles trocava olhares conforme caminhavam. Os sinos do seu lado eram mais graves, como que um toque de recolher e cada um sentia-se no conforto de abraço pela harmonia dos toques, era algo reconfortante. Ele estava recoberto por uma capa de urso dos ombros até o calcanhar. Sua roupa era também um azul, mas bem escuro tinha botões pretos. Seus sapatos faziam-lhe ter a sensação de estar voando, impecável. Mas conforme caminhava, por um segundo, ele dera um passo em falso, imperceptível, mas dera e ele sabia disso.
No centro, os aguardando estava o conselheiro-mor por baixo de sua touca branca que alguns julgavam vê-la brilhar como o prateado da lua e cintilar como as estrelas, iluminando o local como a noite do lado de fora da catedral do centro de Lubrín. À sua direita, em cima de uma almofada, estava a coroa de Ventura que era alta, com decorações de uvas, escolhidas por Gustavo e cada uva era uma pedra preciosa. À esquerda a nova coroa de Gustavo com uma pedra de zircônia cúbica.
Eles se aproximaram e se deram as mãos, se olhando nos olhos depois para todos. E soou um salve de palmas. Algumas mulheres e homens choravam, e deixavam suas lágrimas caírem no chão. As palmas pararam e o silêncio voltou. Sid olhou-os com aqueles olhos de criança e sorrira. Primeiro, pegou a coroa de Gustavo, que numa reverência fora posta em sua cabeça. Depois, de mesmo modo, coroou Ventura. Todos estavam os olhando. Gustavo olhou para ela sorrindo e pegou-a nos braços e lhe dera um beijo, que o tornava rei e a tornava rainha de Lubrín.
            É aqui que começa toda essa história. Embora você venha lendo de Gustavo e Ventura até agora, nosso protagonista ainda nem nasceu e muitas coisas ainda vão acontecer, nessa história, desse lugar onde tudo que conto aqui, já aconteceu.